Duas da manhã no edifício Pascoal e poucas luzes acesa, noite
natalina e boa parte dos poucos moradores daquele prédio de pouco mais de sete
andares não estavam em casa. Duas ou três luzes a mais, apenas. Era uma noite
fria, tranquila para aquele bairro do Rio Grande do Sul. No térreo não havia
mais ninguém ali, àquela hora. No oitavo andar, o último do Pascoal, tocava um
jazz que dava um clima mais a dois no local. O corredor estava vazio e, não se
via ninguém, apenas a porta entre aberta e um feixe de luz do apartamento
312. Na sala do apartamento, copos e
pratos pareciam ter sido usados por animais, estavam no chão e quebrados. A
janela estava aberta e, sentada ao chão estava Clarice, ao seu lado: Uma fatia
de torta de amora, um garfo largado no chão e uma faca, até então melada com
geleia de morango.
–
Amor, amor... - Sussurrava a jovem com cabelos
castanhos e pele clara, mantendo-se de olhos fechados. O vento que entrava pela
janela, fazia com que a cortina flutuasse. Clarice tomou forças, levantou-se e olhou
pela janela a rua escura e sem movimento. - Era pra sermos você e eu! -
exclamou.
No chão, dois corpos juntinhos no asfalto. Quase que coladinhos,
geleia de morango havia em quantidade demasiada no chão, estão ali Gerardo e
Andrea. Essa história começa assim. Um final que não trágico. Às vezes o amor
mela a vida e alma com um pouco de geleia de morango.
25 de dezembro de 2013 – 20h.
–
Aqui, Andrea tira o frango do forno! Gera, você não tá pronto? Os convidados estão
quase chegando! - Quase em estado de pânico, Clarice andava de um lado a outro
organizando os últimos detalhes da ceia natalina que iria dar para alguns
amigos.
O tempo passava-se e, o jantar e a decoração estavam prontos,
os convidados – oito ou nove gatos pingados na sala comiam e bebiam. Tudo
parecia maravilhoso, e estava!
–
Esqueceu de comprar mais gelo, Clar? - Gritou
Gerardo da sala. Da cozinha, Clarice e Andrea preparavam-se para servir o
jantar.
–
Amor vai comprar! - Respondeu Clarice.
–
Preciso de ajuda, são muitas bolsas... Não tem
como subir com tudo sozinho na volta...
Logo Andrea, amiga a anos do casal, se prontificou. Pegou a
bolsa e o celular, e saiu junto a Gerardo. A caminho do supermercado, Gerardo e
Andrea estavam animados e o som do carro, os distraiu por um momento. O carro
atravessou o sinal vermelho, quase colidindo com outro carro, que estava em sua
vez. Gerardo freou forte, e a garota foi de vez no para-brisa, machucando a
testa.
–
AU! - Disse Andrea levando imediatamente sua mão
à testa, que agora sangrava.
–
UH! Deixe-me ver. - Disse Gerardo limpando o
sangue com um pano qualquer ali do carro. - Não foi nada grave, vai passar. -
Gerardo e Andrea se olhavam, não era normal entre eles manter o olhar fixo ao
outro por mais de 20 segundos! Andrea fechou os olhos, e logo sentiu outros
lábios tocarem aos seus. Foi um beijo de
sentimento, como nunca Andrea antes havia sentido.
–
Desculpe. - Disse Gerardo ao afastar-se da
garota. - Não podemos fazer isso, a Clarice nos mataria!
Andrea então permaneceu em silêncio. Cabisbaixa, apenas
concentrou-se na sua dor. O caminho foi
feito, compraram as bolsas de gelo, e voltaram. Perto de casa, Andrea
finalmente criou coragem e falou:
–
Não precisa ela saber.
–
O que? - Perguntou surpreso, Gerardo.
–
É. Não precisa ela saber! - Repetiu Andrea. -
Passamos muito tempo juntos, Clarice e eu temos muito em comum e você não vai
estranhar, e nem ela perceber.
–
Talvez... - Nesse momento Gerardo analisou e
imaginou as duas como uma. -… Mas, eu amo a Clar, e ela não merece ser traída.
–
E quem falou que vamos ter algo sério? Nesse
instante, apenas viveremos o momento, É o que importa, - Andrea parecia segura
e afim de talvez, quem sabe, perder sua amizade com Clarice.
Assim que os dois ali no carro criaram coragem para se olhar,
mal perceberam que já estava estacionado de frente a casa, e voltaram a se
beijar. Da janela, Clarice observou o outro lado da rua, onde o carro estava
estacionado, e viu a cena que jamais esperaria ver em sua vida.
Ela, lógico, manteve a pose e não fez escândalo. Apenas
percebeu que uma lágrima havia fugido de seus olhos, porém logo ela a secou.
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