Cena 01. Clip. São Paulo. Exterior,
transição: Noite/Dia.
Clip da cidade de São Paulo. A noite
vira dia, amanhece.
Corta para:
Cena 02. Casa de Astrogildo. Interior,
dia.
Estamos na antiga casa de Socorro. Raimunda e Astrogildo dormem no
sofá. A casa está numa desordem geral. O som de uma campainha acorda
Astrogildo, que vai atender a porta.
ASTROGILDO
- Já
vai... Já vai... (Irritado) Cacete, espera aí!
Astrogildo
abre a porta. Roslene está lá.
ROSLENE
- Bom
dia. É aqui a casa da Socorro?
ASTROGILDO
- (Medindo
Roslene) Era sim... Mas ela foi embora. Eu sou o marido/
RAIMUNDA
- (Da
sala) Ex marido!
ASTROGILDO
- Ex
marido dela. Ela foi embora ontem, louca.
ROSLENE
- A minha
prima é mesmo maluca de pedra.
ASTROGILDO
- Ela é
tua prima?
ROSLENE
- Claro,
imbecil. Ou você acha que eu vim aqui te ver? Enfim, existe algo sério que
precisamos conversar. Qual foi o motivo da sua separação?
Corta
para os três sentados no sofá, como se tivessem conversado bastante.
ASTROGILDO
- (Mentindo)
O ciúme excessivo da Socorro. Eu sempre fui um homem fiel e ela nunca confiou
em mim. Decidi colocar ela pra fora de casa, o que me doeu/
ROSLENE
- E você
se sente atraído pela fortuna nova dela?
ASTROGILDO
- Como...?
ROSLENE
- Eu
proponha uma aliança. A você e a Raimunda. A Socorro tá escondendo um diamante,
caríssimo. Se eu achar eu dou R$500.000,00 pra cada um dos dois!
RAIMUNDA-
E o
que, exatamente, nós precisaríamos fazer?
ROSLENE
- Não lhe
parece óbvio? Me ajudar a roubar o diamante... 'Fragile'!
CAM
foca nas expressões confusas de Raimunda e Astrogildo, e na expressão maluca de
Roslene, que começa a rir.
Continuação.
ASTROGILDO
- Roubar como? A Socorro me botou pra fora de
casa!
ROSLENE
- Eu vou ajudar vocês dois a se infiltrarem na
nova vida da Socorro. Eu tenho certeza que ela vai procurar alguém. Ela é muito
burra...
Corta
para:
Cena
03. Agência de empregos. Interior, dia.
Estamos
em uma agência de empregos. Alguns balcões com atendentes, alguns conversam com
clientes, outros falam ao telefone. Chega Socorro, que senta em uma das mesas e
começa a conversar com o atendente.
SOCORRO
- (Chegando, estressada) Realmente é o fim da
picada ter que vir até esse barraco no Itaquera atrás de empregada doméstica.
ATENDENTE - (Confuso) Quem é você, boneca?
SOCORRO - (Nervosa) Boneca não, porque não me venderem na deep web, meu amor! Meu nome é Help.
ATENDENTE - (Confuso) Como?
SOCORRO - Para você, que não é poliglota como eu, my name is Socorro! SO-COR-RO!
ATENDENTE - Ah sim! Foi a senhora, com essa voz de urubu velho, que me ligou hoje cedo! Chamarei as candidatas para serem empregadas da senhora: Monstrualda, Vera e Yolanda!
ATENDENTE - (Confuso) Quem é você, boneca?
SOCORRO - (Nervosa) Boneca não, porque não me venderem na deep web, meu amor! Meu nome é Help.
ATENDENTE - (Confuso) Como?
SOCORRO - Para você, que não é poliglota como eu, my name is Socorro! SO-COR-RO!
ATENDENTE - Ah sim! Foi a senhora, com essa voz de urubu velho, que me ligou hoje cedo! Chamarei as candidatas para serem empregadas da senhora: Monstrualda, Vera e Yolanda!
Chegam
três mulheres, dentre elas Vera Fisher, disfarçada.
SOCORRO - (Espantada) Credo! Uma mais feia do que a outra!
ATENDENTE - Monstrualda, se apresente, por favor!
MONSTRUALDA - Meu nome é Monstrualda, sou de Diadema, tenho 20 anos e estou nessa profissão há um ano/
SOCORRO - (Sem paciência) Olha, com licença, mas vou interromper essa conversa. Sabe porquê? Porque eu não tenho paciência com gente que está começando! E além de tudo, ela tem cara de monstro!
SOCORRO - (Espantada) Credo! Uma mais feia do que a outra!
ATENDENTE - Monstrualda, se apresente, por favor!
MONSTRUALDA - Meu nome é Monstrualda, sou de Diadema, tenho 20 anos e estou nessa profissão há um ano/
SOCORRO - (Sem paciência) Olha, com licença, mas vou interromper essa conversa. Sabe porquê? Porque eu não tenho paciência com gente que está começando! E além de tudo, ela tem cara de monstro!
Monstrualda
sai.
ATENDENTE - Vera, sua vez!
VERA - (Meio boba) É... Hããã... Eu Vera e... Vera gosta de Socorro...
SOCORRO - (Rindo) Mas espera aí, você é a Vera Fischer, a atriz! Pode esquecer, eu não quero uma drogada que fica sentada o tempo todo para ser minha empregada!
ATENDENTE - Yolanda, meu bem, agora é você!
YOLANDA - Mi nombre és Yolanda, yo soy de Paraguay...
SOCORRO - (Gritando) Paraguai? Seu desgraçado, não estou procurando um monstro, uma plastificada ou uma cidadã cucaracha, EU QUERO UMA EMPREGADA! Amanhã, eu volto aqui com o meu advogado, palhaço!
ATENDENTE - Desculpe, madame, mas para que?
SOCORRO - Para denunciar essa espelunca e deportar essa guantanamera de volta para o Paraguai! Com licença!
ATENDENTE - Vera, sua vez!
VERA - (Meio boba) É... Hããã... Eu Vera e... Vera gosta de Socorro...
SOCORRO - (Rindo) Mas espera aí, você é a Vera Fischer, a atriz! Pode esquecer, eu não quero uma drogada que fica sentada o tempo todo para ser minha empregada!
ATENDENTE - Yolanda, meu bem, agora é você!
YOLANDA - Mi nombre és Yolanda, yo soy de Paraguay...
SOCORRO - (Gritando) Paraguai? Seu desgraçado, não estou procurando um monstro, uma plastificada ou uma cidadã cucaracha, EU QUERO UMA EMPREGADA! Amanhã, eu volto aqui com o meu advogado, palhaço!
ATENDENTE - Desculpe, madame, mas para que?
SOCORRO - Para denunciar essa espelunca e deportar essa guantanamera de volta para o Paraguai! Com licença!
ATENDENTE
- (Gritando) Suma daqui, sua degenerada! Gorda,
monstra! Vai morrer seca!
SOCORRO
- Vai tomar no seu (CENSURA)!
Socorro
sai. Na rua, fala sozinha.
SOCORRO
- (Sozinha) Mas será possível? Eu não tenho
sorte! Mas isso vai mudar... E eu tenho certeza/
Nesse
momento, em que a mulher atravessa a rua, um carro quase a atropela. Ela corre
e acaba caindo no chão. Um cachorro vêm e urina nela.
Corta
para:
Cena
04. Cartomante. Interior, dia.
Roslene
entra num lugar esfumaçado. Uma mesa com duas cadeiras é o centro. Ela senta em
uma das cadeiras.
SOCORRO
- (Off., pensamento) Espero mesmo que essa
madame Geiza seja uma boa cartomante...
Chega
Geiza, a mesma que estava no enterro de Difuntina, porém com cabelos brancos e
dentes mais podres. Ela está vestida de cartomante. Se senta na outra cadeira.
GEIZA -
Eu sou uma ótima cartomante, Maria do
Socorro. Pode acreditar.
SOCORRO
- (Gritando, assustada) Pataqueopareo! Você? Como
chegou aqui? E por que tão feia? E como sabe meu nome?
GEIZA -
Cheguei de avião, sua pobre idiota. Não me
ofenda, cretina. Estou apenas caracterizada como cartomante. Ou você acha que
os clientes vão preferir uma gostosa atendendo? E o seu nome eu sei porque eu
perguntei ao padre no dia do enterro, nada de mais.
SOCORRO
- Ah, sim...
GEIZA -
Então você veio falar sobre sua falta de
sorte, é?
SOCORRO
- Como você sabe?
GEIZA -
Eu sou vidente, jumenta. E também você tá
fedendo mijo de cachorro.
SOCORRO
- Me ajuda, madame Geiza! Me ajuda!
GEIZA -
Claro, ainda mais agora que você está rica...
SOCORRO
- Você leu meu pensamento pra saber isso?
GEIZA -
Claro que não, idiota. Eu vi na internet,
sabia? (Pega um tablet debaixo da mesa e mostra para Socorro uma notícia onde
ela aparece. Lendo:) 'Milionária travesti conhecida como Difuntina morre e
deixa herança para as duas sobrinhas; Socorro e Roslene'. Saiu no EGO, fofa.
SOCORRO
- Mas que vidente de bosta você é, hein/
GEIZA -
(Corta) A sua sorte vai chegar apenas quando
você abrir mão dos seus bens.
SOCORRO
- (Chocada) Mas eu acabei de ficar rica!
GEIZA -
Não aquilo que você necessita... Apenas
aquilo que lhe é supérfluo! Você tem um objeto que não lhe pertence, e só será
feliz quando entregar as pessoas certas... Trazendo de volta a sua família a
harmonia e amor que sua tia sempre desejou!
SOCORRO
- Você quer que eu abra mão do 'Fragile'?
GEIZA -
Não eu. Sua tia.
SOCORRO
- (Se levantando) Nem por um cacete! Aposto que
foi a Roslene que lhe pagou pra dizer isso, não é? Sua vidente de bosta!
GEIZA -
(Incorporando) 'Pensando em conseguir de uma
só vez todos os ovos de ouro que a galinha poderia lhe dar, ele a matou e a
abriu apenas para descobrir que não havia nada dentro dela!'
SOCORRO
- Satânica! Eu vou sair daqui, isso sim! A
minha sorte já voltou e/
Nesse
momento, ao sair, Socorro leva um tompo. Grita:
SOCORRO
- Eu tô bem, jumenta!
Socorro
levanta e sai. Geiza fica sozinha.
GEIZA -
(Off., pensamento) Mal sabe ela que quem
me pagou pra estar aqui foi a tia dela... (Começa a rir)
Corta
para:
Cena
05. Casa de Astrogildo. Interior, dia.
Continuação imediata da cena 01. Roslene
e Astrogildo estão sentados no sofá do barraco. Raimunda em pé, com a mão na
cintura.
RAIMUNDA - Ser a empregada daquela
emergente de quinta? Deus me livre, que ideia de jerico é essa?
ASTROGILDO - Raimunda,
eu sei que você não quer trabalhar pra Socorro, mas ouve a proposta da Roslene!
RAIMUNDA - Eu
tenho dois ouvidos, Roslene, e eu lavo eles todos os dias. Você tá esperando o
que pra começar a falar?
ROSLENE - Olha,
Raimunda, a Socorro viajou pro Acre, onde eu e minha finada tia Difuntina
moramos.
RAIMUNDA - Ué,
se ela já bateu as botas, ela não mora mais lá.
ROSLENE - Posso
continuar, ou vai ficar me interrompendo?
RAIMUNDA - Salve,
simpatia! Continua logo.
ROSLENE - Pois
bem. A tia Difuntina deixou de herança pra Socorro um diamante que vale uma
nota. Trabalhando na casa da Socorro, você pode surrupiar o diamante das coisas
dela e nós vendemos.
RAIMUNDA - E
o que o ganho com isso?
ASTROGILDO - A
gente combinou de te dar 10% do valor.
RAIMUNDA - 10%?
Tô fora. 60% e não se fala mais nisso.
ROSLENE - Que
tal 40%?
Raimunda faz que não com a cabeça.
ASTROGILDO - 45%?
RAIMUNDA - 55%.
ROSLENE - 60%?
RAIMUNDA - 40%.
ASTROGILDO - 65%?
RAIMUNDA - 10%
e não se fala mais nisso.
Astrogildo e Roslene riem.
RAIMUNDA - Mas,
Astrogildo, além dos 10% do dinheiro, eu também quero que você tire aquele
bicho do meu formigueiro.
ASTROGILDO - Ai,
Raimundinha, o que tá formigando é o meu tamanduá pra entrar no seu
formigueiro.
ROSLENE - Já
acabou o sexo verbal?
ASTROGILDO Só
porque você interrompeu.
ROSLENE - Não,
podem continuar. Meu (CENSURA) tava até tendo um orgasmo.
Raimunda e Astrogildo olham com cara de
estranhamento para Roslene.
Roslene: Piada
de acreano. Vocês, paulistas, são lerdos pra cacete, hein?
Corta para:
Cena 06. Loja de Fantasias. Interior,
dia.
Estamos em uma pequena e abafada loja.
Fantasias de todos os tipos, por todos os lados. No balcão uma campainha de
caveira, Raimunda- Que acabou de chegar- toca. Ninguém vêm.
RAIMUNDA - (Berrando,
irritada) Cadê a porcaria do atendente pra me ajudar nessa espelunca?
Surge uma moça magra e feia.
MOÇA - Cá
estou eu, docinho. Veio comprar uma fantasia para o dia das bruxas? Se for nem
precisa gastar seu dinheiro, porque você, com essa cara feia, dá uma bruxa
perfeita...
RAIMUNDA - (Irritada)
Vá se olhar no espelho, miss Morro-do-Alemão! Estou aqui pra um assunto sério.
MOÇA - O
que você quer?
RAIMUNDA - Eu
vou querer uma fantasia e máscara de gorda. Ah, e uma peruca loira platinada,
estilo Branca Letícia, por favor.
MOÇA - Gorda?
(Rindo) Meu amor, você já é uma baleia, uma orca!
RAIMUNDA - (Gritando,
sacudindo a moça) Escuta aqui, miss Etiópia: Eu sou gostosa, sua anoréxica do
escambal! Desnutrida!
MOÇA - (Assustada)
Tudo bem... Eu vou ver o que eu posso fazer pela senhora!
A moça atendente sai.
RAIMUNDA - Vai,
some! (Cantando) De quem é esse jegue? De quem é esse jegue? De quem é esse jegue?
Ele quer me morder!
A moça volta com uma grande caixa e uma
peruca loira platinada em mãos.
MOÇA - Isto
é o melhor que teremos.
RAIMUNDA - Passa
logo, mocreia, ridícula! Toma a porcaria do dinheiro, adeus.
Raimunda pega tudo, entrega o dinheiro e
sai.
RAIMUNDA - (Sozinha)
Agora eu vou ser... Gorda, baleia, saco de areia!
Corta para:
Cena 07. Mansão de Socorro. Interior,
dia.
Estamos na mansão de Socorro, agora
cheia de móveis elegantes e caros. Num sofá branco está deitada Socorro, que
come bombons e bebe champanhe. Ela assiste TV num aparelho gigante.
SOCORRO - (Falando
sozinha) Oh, my darling... Que tarde deliciosa, que champanhe delicioso, que
trufas deliciosas, que tudo delicioso!
Toca campainha.
SOCORRO - (Gritando)
Empregada! Empregada! Abre a porta, pobre diaba! (Rindo) Isso rimou... Será que
serei cantora de funk ostentação? (GRITO) EMPREGADA?
Toque insistente de campainha.
SOCORRO - Ah
é... Eu não tenho uma empregada. Mas que merda.
Socorro levanta e vai até a porta. Abre.
Do outro lado Raimunda, irreconhecível. Muito gorda, loira platinada. B=Veste
um uniforme de empregada.
SOCORRO - Quem
é você?
RAIMUNDA - (Entrando)
Meu nome é Branca Mendes, e eu sou sua mais nova empregada. Nasci no Paraná,
numa cidade chamada Dois Vizinhos e/
SOCORRO - E
o que é que eu tenho a ver com isso?
RAIMUNDA - Fiquei
sabendo que você está precisando de uma empregada... Estou aqui pra isso!
SOCORRO - Dá
uma voltinha.
Raimunda dá, com dificuldade, uma
voltinha. Socorro ri.
SOCORRO - (Rindo)
Gostei de você... Mas se você quiser trabalhar aqui vai ter que ter um apelido.
Não gosto de chamar a criadagem pelo nome, deixa transparecer intimidade.
RAIMUNDA - Sem
problema, pode me chamar do que quiser.
SOCORRO - Ótimo.
Você pode escolher um apelido: Pudim de banha, Bola de sebo, Pneu de trator,
Barril destampado, Amontoado de lipídios, Corpo Celeste, Cintura de ovo, Moby
Dick, Lona de circo, Calça de capa de caminhão, Rolha de Poço, Jamanta,
Elefante, Montanha, Chupeta de Baleia e Bolota. Qual prefere?
RAIMUNDA - Bolota
me agrada os ouvidos, senhora.
SOCORRO - Então
você está contratada, bolota. Gostei de você, sabe? Pra começar, arruma aquela
papelada ali.
Raimunda começa a arrumar um amontoado
de papel. Transição: Horas se passam, Raimunda cansada. Socorro ronca no sofá.
RAIMUNDA - (Off.,
pensamento) Nem estando rica essa vaca velha deixa de roncar feito uma carpa
com caganeira... (Fala) Dona Socorro? (GRITA) SOCORRO, acorda, imbecil?
SOCORRO - Hã?
Que é que foi? Que é que há? Tá me olhando por que, quer me dar?
RAIMUNDA - Já
terminei o que a senhora me pediu.
SOCORRO - Ótimo,
bolota. Agora vai fazer meu almoço, vai. Mas vê se não come tudo, viu? Obesa,
mórbida.
RAIMUNDA - Com
licença, dona Socorro.
Raimunda Sai.
SOCORRO - Esse
amontoado de lipídios veio em uma boa hora... Seja bem vinda, baleia branca!
Corta para o corredor, Raimunda anda.
RAIMUNDA - (off.,
pensamento) Degenerada! Vadia, penosa... Eu vou acabar com sua alegria... MY
DARLIG!
Corta para:
Cena 08. Casa de Astrogildo, quarto.
Interior, dia.
Astrogildo está deitado na cama de seu
quarto, comendo batatas chips. Roslene chega.
ROSLENE - Astrogildo,
eu acabo de ter uma ideia!
ASTROGILDO - Ih,
é por isso que começou a feder.
ROSLENE - Ô
ignorante, deixa eu falar primeiro.
ASTROGILDO - Fala
logo, ô diabete.
ROSLENE - Diabete?
ASTROGILDO - É,
a dançarina do diabo. Mas desembucha logo.
ROSLENE - Pois
bem. Que tal você ser o motorista da Socorro?
ASTROGILDO - Ah,
pronto. Raimunda empregada, Astrogildo motorista, e você fica no bem bom, com
sombra e água fresca, né, sua parasita?
ROSLENE - Calma,
negão. O Natal tá chegando.
ASTROGILDO - Não
me diga. Eu tava aqui imaginando: “por que será que a cidade tá toda enfeitada
com luzinhas e pisca-piscas e tem uma árvore de Natal na casa de todo mundo?”.
ROSLENE - Mas
que mania essa de vocês de interromper a fala dos outros, pelo amor de Deus.
Espera eu terminar. Bem, como eu dizia, o Natal tá chegando. Você pode usar
isso como desculpa para dizer pra Socorro que tá arrependido e faz tudo por
ela. Então, você se candidata a motorista e a sequestra. Daí...
ASTROGILDO
- Ah, já saquei. Daí, a gente tem tempo
suficiente pra roubar o diamante e ficar com a grana.
ROSLENE
- Ah, Deus seja louvado, pelo menos você tem um
cérebro.
ASTROGILDO
- Além de um cérebro eu tenho outras coisas
espalhadas pelo meu corpo. Cê quer ver?
ROSLENE
- Agora!
Roslene
entra debaixo das cobertas com Astrogildo.
ROSLENE
- (Off.) Astrogildo, é só isso?
ASTROGILDO
- (Off.) Só isso o quê?
ROSLENE
- (Off.) Sei lá, eu imaginava uma coisa
maior.
ASTROGILDO
- (Off.) É que você ainda não viu em
ação. Mas vai ver já, já.
Corta
para:
Cena
09. Clip. São Paulo. Exterior, noite/dia.
Amanhece
em São Paulo. Edição mostra-nos um clip.
Cena
10. Mansão de Socorro. Interior, dia.
Plano
geral do quarto, enorme, de Socorro, que dorme em uma cama redonda, enorme. Ela
levanta e se espreguiça. Sai do quarto e desce as enormes escadas.
SOCORRO
- (Gritando) Bolota? Bolota?
Raimunda
chega, correndo.
RAIMUNDA
- Chamou?
SOCORRO
- Não, eu não chamei. Eu estou gritando
'Bolota' pra um tatu bola que passou correndo por aqui.
RAIMUNDA
- Nesse caso eu posso ajudar a senhor/
SOCORRO
- (Grito) Claro que eu te chamei, sua anta! Eu
quero que você me faça um suco de tangerina, natural.
RAIMUNDA
- Sim senhora.
Raimunda
sai. Começa a tocar a campainha e Raimunda volta. Atende a porta, é Astrogildo.
RAIMUNDA
- (Cochichando) O que você quer aqui?
ASTROGILDO
- (Não reconhecendo) Sai pra lá, pudim de
carne...
SOCORRO
- Quem é?
ASTROGILDO
- (Entra, com um buquê de flores) Sou eu, Socorro...
Seu negão!
SOCORRO
- Meu cagão, só se for. Suma daqui, faça-me o
favor!
ASTROGILDO
- Eu não vim pedir pra voltar, Socorro.
SOCORRO
- Não!? E veio fazer o que, então?
ASTROGILDO
- É natal, Socorro.
SOCORRO
- Jura? Eu tinha certeza que era páscoa.
ASTROGILDO
- (Grita) Cala a boca! É uma festa cristã,
cachorra, do perdão, amor e/
SOCORRO
- Então eu sou pagã. Sai daqui, seu nego
fedorento/
ASTROGILDO
- (Grita) Cala a boca! Tu vai ouvir cachorra!
Eu vim aqui pedir um emprego.
SOCORRO
- (Chocada, rindo) Emprego? Meu amor, tú é o
clássico vagabundo sustentado pela mulher!
ASTROGILDO
- Me respeita, Socorro. Eu tô aqui te
implorando um emprego. Eu percebi, depois que tu vazou de casa, que meus dias
sem você são como um samba sem cerveja: Não tem graça.
SOCORRO
- (Emocionada) Que lindo isso, Astro!
ASTROGILDO
- Então você... Me perda?
SOCORRO
- (Rindo) Claro que não, mas aceito te dar o
emprego. Quero que seja meu motorista particular: Você me levará para encontros
amorosos, noites quentes com amantes jovens e potentes.
ASTROGILDO
- Amantes, vocês? Com essa cara feia?
SOCORRO
- O que disse?
ASTROGILDO
- Disse que obedeço você, pois é minha sereia.
Os dois se encaram. Corta para:
Cena 12.
Mansão de Socorro/Sala. Interior, noite.
Socorro
está sentada no sofá, bebendo vinho numa taça de vidro. A campainha toca.
SOCORRO – Empregada?
Não ouviu a campainha?
Raimunda
corre para atender a porta.
SOCORRO – Finalmente,
né, sua/
A
empregada abre a porta e Roslene está em pé, segurando uma bolsa.
ROSLENE – Oi, prima!
Socorro faz
uma expressão de choque. Se levanta, Roslene entra.
SOCORRO – (A
empregada) Tá esperando o quê pra ir embora, sua toupeira? Vai, volta pra
cozinha.
A
empregada sai.
SOCORRO – Roslene.
Que surpresa tê-la aqui em minha mansão.
ROSLENE – Eu sei que
você está muito alegre, mas não é pra tanto, eu/
SOCORRO – Não, não,
eu não estou alegre. Quem disse que eu estou alegre? É uma surpresa mais que
desagradável. O que você veio fazer aqui, sua meretriz?
ROSLENE – Olha, não
me faz rodar a baiana aqui não, que eu não quero acabar com essa porcaria de
casa.
SOCORRO – Mansão,
minha querida, mansão. É claro que você não sabe o significado dessa palavra.
Sempre viveu naquele barraco, que mais parecia uma ‘cintina’.
ROSLENE – Alô
Brasil, aqui não tem educação! Deixa eu falar, sua macumbeira.
SOCORRO – Macumbeira
não, ô, prima do interior.
ROSLENE – Acre não é
interior, querida, é apenas um estado um pouco mais isolado. Quando que as
pessoas vão entender isso?
SOCORRO – Ah, claro,
um pouco mais isolado. Você ficou sabendo que o Oscar Niemeyer começou a
projetar Brasília? Vai ser a nova capital do Brasil.
ROSLENE – Pode zoar
à vontade, Socorro. Mas, quando terminar, ouve o que eu tenho pra dizer.
SOCORRO – Eu sou
toda ouvidos a você, querida prima. Fale o que tens pra falar.
Roslene se
ajoelha.
ROSLENE – Socorro,
por favor, me dá o diamante que a tia Difuntina/
Ouve-se um
trovão.
ROSLENE – Que a
FINADA tia Difuntina te deu. Por favor, prima! É uma coisa que não te
acrescenta nada... Mas que tem valor sentimental pra mim!
SOCORRO – Ah, deixa
eu ver se eu entendi: Você veio aqui simplesmente pra se ajoelhar e me pedir o
diamante que a tia Difuntina/
Ouve-se
outro trovão.
SOCORRO – Que a
FINADA tia Difuntina me deu? É isso?
Roslene assente
com a cabeça.
SOCORRO – Mas nem que
a vaca tussa. Bateu com a cabeça na privada enquanto comia o jantar, fofa?
Roslene
agarra as pernas de Socorro e começa a balançar a prima.
ROSLENE – (Chora) Por
favoooooooooooooooooooooooorrrr!!! Eu ne-ces-si-to desse diamante, Socorro. Por
favooooor!!!
SOCORRO – Eu é que
tenho que pedir por favor! (Grita) PRA VOCÊ SOLTAR MINHAS PERNAS!!
Roslene
não solta. Socorro dá um tapa na mulher, que cai no chão.
SOCORRO – Eu mandei
me soltar, sua indigente indigestível. Não tirou a cera do ouvido? Ah, acho que
lá no Acre ainda não fabricam cotonetes.
Roslene
agarra novamente as pernas de Socorro.
ROSLENE – Vai,
Socorrinho, me dá o diamante.
Socorro
joga Roslene novamente no chão e começa a estapeá-la.
SOCORRO – (Estapeando)
Já mandei você soltar a porcaria das minhas pernas.
As duas
continuam se agredir. Muita ação, gritos. Socorro joga Roslene em cima de uma
mesa cheia de cristais. Roslene pula em cima dela e morde seu nariz. Chega
Raimunda e outras duas empregadas, que tentam intervir. Raimunda não deixa.
Corta
para:
Cena 13.
Casa de Astrogildo. Interior, dia.
Astrogildo
assiste televisão, deitado no sofá. Chega Roslene com o braço enfaixado.
ASTROGILDO
– O que
aconteceu?
ROSLENE – Aconteceu
que a bruta infeliz da sua ex esposa tentou me matar! Aquela desgraçada... Mas
eu já decidi, Astrogildo. Hoje, 18 de Dezembro do ano de 2014, eu, você e a
Raimunda iremos acabar com a alegria dessa falsa rica de meia tigelinha.
CAM foca
na expressão assustada de Astrogildo e no sorriso malvado de Roslene.
Corta
para:
Cena 14.
Mansão de Socorro. Interior, dia.
Socorro
está deitada no sofá comendo bombons. Um curativo em seu nariz. Toca a
campainha.
SOCORRO – Mas que
diabos! Será que eu não posso aproveitar minha riqueza em paz!? (Grita) Gorda,
baleia, saco de areia!!! A campainha, por favor.
Raimunda
corre e abre a porta. Astrogildo de terno branco com um buquê de flores.
ASTROGILDO
– (A
Raimunda) E aí, simpatia? Tá gorda, hein.
RAIMUNDA –
(Sussurrando)
O que você está fazendo aqui?
ASTROGILDO
– Vai pro
diabo, satanás. Nem te conheço, coisa gorda! (Entra) Cadê minha nega?
SOCORRO – (Irritada)
Volta pro mar, oferenda ruim!
ASTROGILDO
– Pô, meu
dengo... Olha lá fora, surpresa pra você!
Socorro
sai, olha pelas janelas. Um caminhão cheio de rosas brancas.
SOCORRO – Nossa,
negão... É pra mim?
ASTROGILDO
– É sim,
minha gostosa...!
SOCORRO – (Grita)
Sai daqui, empregada! Vai, gorda!
Raimunda
sai.
ASTROGILDO
– Quem é
essa, hein?
SOCORRO – Não sei...
Nunca vi mais gorda!
Os dois
riem.
SOCORRO – Eu te
perdoo, meu negão... Vamos pra cama, quero ser consumida!
Os dois se agarram e sobem as escadas. A sala fica vazia e Roslene
entra. Ela traz consigo uma arma e observa Raimunda subir com uma panela, nas
pontas dos pés. Sobe também, de fininho.
Corta
para:
Cena 15.
Mansão de Socorro, quarto da mesma. Interior, dia.
Socorro e
Astrogildo entram. Se agarram. Ela começa a tirar a roupa, ele a observa.
SOCORRO – Tira logo
essa cafonice do seu corpo e me possua, delícia!
Astrogildo
fica só de cuecas. Os dois se agarram e deitam na cama. Entra Raimunda, com a
panela em mãos, nervosa.
RAIMUNDA –
(Grita)
Mas que palhaçada é essa!?
SOCORRO – Isso digo
eu! Como é que você, uma criada de bosta entra no MEU quarto sem bater num
momento desses, com uma panela em mãos e gritando? Hein, catinguenta?
Astrogildo
observa Raimunda e parece reconhece-la. Faz gestos para que ela saia.
RAIMUNDA –
É isso
mesmo, sua songa monga! Esse negão é meu!
Nesse
momento Roslene entreabre a porta e começa a ouvir tudo, com a arma em mãos.
SOCORRO – Essa
voz... Eu conheço essa voz, sua cretina! É você, Raimunda!?!
Raimunda
tira a peruca e parte do enchimento que lhe faz gorda. Expressão de choque de
Socorro.
RAIMUNDA –
Sou eu,
sim, sua tamanduá vesga! Orca, burra...! Bolota é mãe, sua emergente de bosta!
SOCORRO – (Grita)
Seus desgraçados! Eu vou botar todo mundo para correr, seus nojentos! Eu sou
uma mulher honrada e decente...
ASTROGILDO
– Calma aí,
potranca! Eu não tenho nada a ver com isso!
RAIMUNDA –
Tem sim!
Nós dois estamos aqui para roubar o diamante!
SOCORRO – Eu sabia!
Vocês NÃO vão ter diamante nenhum, seus ridículos! Eu quero vocês fora daqui.
Mas antes eu vou ensinar essa Raimunda a virar gente!
Socorro
começa a bater em Raimunda, que revida. Astrogildo tenta intervir mas leva uma
panelada de Socorro, e cai, desmaiado. Socorro e Raimunda continuam a se
espancar. Socorro consegue pegar a panela novamente e bate na cabeça de
Raimunda, que também desmaia. Se levanta e vai em direção a porta, de onde sai
Roslene, com a arma apontada para ela.
ROSLENE – Chega,
Raimunda! Eu tentei por bem! Tantas vezes... Agora você vai ver do que eu sou capaz!
Roslene
pega a panela, com a arma apontada para Socorro. Com a panela bate em Socorro,
que desmaia. Astrogildo e Raimunda acordam.
Corta
para:
Cena 16.
Mansão de Socorro. Exterior, dia.
Estamos no
lado de fora da enorme mansão de Socorro. Um carro está passado em frente a
ela. Da casa de Socorro sai Astrogildo, que carrega a mulher nos braços, desmaiada.
Logo atrás vem Roslene e Raimunda, observando todos os lados, com medo. Eles
entram no carro, que sai. CAM passeia até uma árvore, no quintal em frente da
casa de Socorro. Uma pessoa misteriosa com um casaco grande cinza observa tudo.
Não vemos quem é.
CAM foca
na mulher.
A
imagem congela e vira um diamante, que começa a derreter.
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